No decorrer dos anos, existem muitos momentos que nos marcam profundamente. No entanto, raros são aqueles que conseguem resistir, em qualidade de detalhes, ao contínuo amadurecimento da consciência.
Lembro a primeira vez em que entrei no Palácio Tiradentes, sede do plenário da Alerj. Eu tinha 9 anos. Cruzei toda a platéia de mãos dadas com meu avô, vestia um terninho preto com uma gravata de seda vermelha. Não me assustei ao passar por todas aquelas pessoas. Nos sentamos em uma das primeiras fileiras. Era 24 de fevereiro de 1994. Nesse dia, assisti uma bonita e justa homenagem: meu tio, empresário do mercado financeiro na época, recebia o título de Benemérito do Estado do Rio de Janeiro, concedido pelo Deputado Estadual Délio Leal.
Em 1998, meu tio, eleito Deputado Estadual, assumiu uma cadeira naquela casa. No ano seguinte, ingressei no Cap da UFRRJ. Meu professor de história era um petista histórico, que participou de diversos movimentos armados durante a ditadura. Nossa afinidade era inegável, devo a ele toda a paixão e curiosidade que desenvolvi pela matéria. Porém, foi justamente com esse professor que experimentei minha primeira liberdade crítica.
Poucos meses após o início do mandato, a vice-governadora Benedita abandonou o governo, por conta de insatisfações relativas a distribuição de cargos. Para fazer frente, a bancada do PT decidiu que votaria contra as propostas do governo que fossem encaminhadas à Alerj. Meu tio foi o único deputado que descumpriu a ordem do partido e votou com o governador em todos os projetos.
Essa atitude causou profunda irritação em muitos petistas, meu professor não foi excessão. Em uma discussão sobre política contemporânea e estratégia legislativa, ele aproveitou a oportunidade para criticar sua postura. Ao que não me contive e repliquei: "Não existe traição aqui. O mandato do deputado não é do partido ou da bancada do PT, e sim de 19.122 cidadãos que lhe confiaram o voto. Meu tio não deixará de votar projetos importantes para a população só para fazer pressão por cargos no governo. E eu tenho muito orgulho disso, para um deputado de primeiro mandato essa é uma atitude muito digna e corajosa."
Pelo sorriso de canto no rosto do meu professor, eu havia tocado no ponto certo. Ou seja, havia transposto a hipocrisia que nos rodeia e, dito algo que, de tão justo, era irrefutável. Eu sinto falta desse tempo. Sinto falta desse meu eu, de ter pensamentos puros e idealizados sobre a política. Nos últimos 10 anos, uma série de eventos dizimaram essa minha percepção.
Alfred Lord Tenysson, um dos mais incríveis poetas ingleses, escreveu certa vez: "Authority forgets a dying king". Nos últimos dias, tenho refletido bastante sobre essa frase. Ela é de uma verdade absurda e assustadora. É triste a constatação de que os traidores se vestem da postura e grandeza dos nobres. Infelizmente, não entendem o que realmente significa estar ali.
Aos amigos,
"apesar de você" do Chico,
Marcos André Ceciliano
Um comentário:
Ótimas palavras! Nada mais justo para o momento atual.
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