segunda-feira, dezembro 29, 2008

Um novo tempo para os EUA...

No dia 20 de janeiro de 2009, quando Barack Obama assumir o governo americano, encontrará a pior situação econômica daquela nação desde a segunda guerra mundial. Nos últimos meses, as projeções dos principais índices macroeconômicos foram revisadas drasticamente, para baixo.

Muitos economistas acreditam que a taxa de desemprego possa atingir a marca de 10% no próximo ano; também estimam que a economia perca US$ 1 trilhão de sua capacidade total, o que significaria uma perda de US$ 12 mil na renda da família média americana.

Apesar das projeções assustadoras, a equipe de Obama ainda acredita no potencial de crescimento da economia no longo prazo. Segundo Summers, planejam investimentos estratégicos em saúde, educação e infraestrutura. Por conseguinte, esperam obter um ótimo retorno social, que minimizaria o efeito da perda de renda.

Existe uma dualidade interessante aqui. As decisões econômicas devem contemplar dois cenários para serem realmente eficazes: a criação dos empregos que os americanos precisam e o estabelecimento de um macroregulatório sustentável. Caso contrário, serão perigosamente deficientes.

A equipe econômica de Barack Obama já mostrou comprometimento para com essas condições. Essa é a justificativa para a instituição do "American Recovery and Reinvestment plan", que objetiva a criação de empregos e a garantia da saúde financeira no longo prazo.

As metas de criação de empregos já foram revisadas duas vezes. Agora, a equipe do novo presidente estima 3 milhões de novos empregos. Segundo Summers, mais de 80% destes seriam criados no setor privado. Daí, chegamos a uma interessante constatação: o plano de Obama não apresenta a criação de novos empregos públicos, apenas investimentos para o povo americano.

Recursos que serão transformados em novas salas de aula, laboratórios e bibliotecas para as crianças; que reduzirão a dependência americana frente ao petróleo, no incentivo de energias alternativas; e que colocarão milhares de americanos trabalhando na renovação de estradas, pontes e sistemas públicos de trânsito.

Alguns amigos economistas acreditam que para conseguir crescimento sustentável no longo prazo, o governo Obama deveria apenas preocupar-se em aumentar o consumo. No entanto, transformar o caos atual em uma questão tão simplista, seria, indubitavelmente, uma desculpa para permitir o esmagamento da classe média americana. Algo que o novo presidente americano parece não aceitar!

Aos amigos,
um feliz ano novo,

Marcos André Ceciliano

sexta-feira, dezembro 19, 2008

Solução: inflação! Como assim?

Com o corte de 0,75 p.p. anunciado na última terça-feira pelo Fed, muitas pessoas devem estar questionando se os mecanismos de intervenção do BC americano chegaram ao fim. Uma ótima pergunta! Obviamente, a próxima atuação da autoridade monetária não será através de cortes de juros. No entanto, ainda há muito o que o FED possa fazer.

O que acabo de enunciar está ratificado na seguinte passagem do press release do Fed:

"The Federal Reserve will employ all available tools to promote the resumption of sustainable economic growth and to preserve price stability. In particular, the Committee anticipates that weak economic conditions are likely to warrant exceptionally low levels of the federal funds rate for some time."

A frase "for some time" é estratégica, perfeita para garantir expectativas de juros baixos a longo prazo.

O próximo desafio do FED é derrubar a retórica da "estabilidade de preços". Na verdade, o FED nunca esteve comprometido com a estabilidade de preços, ao contrário do que a maioria possa imaginar. Ainda assim, a inflação durante os mandatos de Paul Volcker e Alan Greenspan sempre tiveram médias entre 2% e 3%. Prova disso é que, durante esse período, o FED poderia ter zerado a inflação se quisesse. Com a atual crise e a profunda redução nos juros, esse zero é uma possibilidade, sem falar do risco de ocorrer deflação continuada. Hoje, o FED precisa atuar para convencer as pessoas de que essa taxa voltará ao índice "normal", entre 2% e 3%.

Elaborei abaixo uma boa sugestão para o próximo press release do FED:

"Na presente circunstância, o comitê reconhece que seria desejável uma inflação moderada sobre o nível geral de preços de uma década, que precisa ser cerca de 30% maior do que o de hoje. Por conta disso, manteremos a postura da política monetária suficientemente parcimoniosa para atingir esse grau de inflação ao longo dos próximos dez anos.

Ou seja, ainda que o FED não possa reduzir a taxa de juros nominal, poderá atuar para a redução da real, incorrendo em um modesto aumento no índice inflacionário.

Alguns podem classificar esse ato como uma mudança radical na política monetária. No entanto, dado o enfraquecimento atual da economia, um pouco de radicalismo certamente geraria algum efeito positivo. Sinceramente, prefiro o FED comprometido com o target de uma inflação modesta, do que ver o governo americano desembolsando um trilhão em novos gastos. Por essa razão, a política monetária deve ser priorizada, não a fiscal. Porque, apenas dessa maneira, a economia retornará ao pleno emprego e voltará à trajetoria de crescimento sustentável sem onerar os futuros contribuintes americanos.

O abandono da "estabilidade de preços" é o equivalente moderno ao abandono do padrão ouro por Rossevelt. Mesmo porque, dentre todas as medidas tomadas por Rossevelt para tirar a economia da recessão, o abandono do padrão ouro foi a mais bem sucedida. Hoje, a política monetária americana não é guiada pelo ouro, ou pelo medo da inflação. Por isso, os norte-americanos devem esquecer esse medo, pelo menos por um tempo. É como Jim Tobin disse certa vez: existem coisas piores que a inflação, e os EUA está infestado delas.

Aos amigos,
o novo disco do The Verve,

Marcos André Cecilino

quarta-feira, dezembro 03, 2008

Os políticos de Washington não leram Keynes...

Os conflitos entre economistas e políticos viraram uma constante na crise americana. Durante a semana, o secretário do Tesouro, Henry Paulson, contestou a ajuda às montadoras em diversas entrevistas. Acabou sendo execrado por vários políticos de Washington. No entanto, Paulson está certo! O pacote geraria um dispêndio absurdo, para um resultado pífio. Elaborei a explicação abaixo para demonstrar o que acabo de enunciar.

Utilizei o modelo "demanda agregada/oferta agregada" para demonstrar o que ocorreu durante a grande depressão nos EUA, uma crise de parâmetros similares.

Começarei com uma função de produção determinando o produto em função do emprego:

Y = F(N)

De acordo com a teoria econômica, em mercados competitivos, a contratação de funcionários deve ocorrer até atingir o ponto em que o salário real se iguale ao produto marginal do trabalho. Se o contrato de trabalho derteminasse o nível de salário real, a questão estaria resolvida. Mas, como os trabalhadores estabelecem contratos utilizando salários nominais, teremos uma curva de oferta agregada em função da média do nível de preço agregado com a média de salários:

Y = S(P/W)

Pela lógica, nosso modelo mostra que o equilíbrio macroeconômico é determinado pela interseção da curva AS com a curva AD, que representa a demanda da economia. Então, teremos um diagrama como o abaixo:



Agora, suponha que um programa como o New Deal tenha elevado os salários nominais. Isso faria com que a curva AS se elevasse, o que nos levaria a um nível de preços maior e uma produção menor:



Foi assim que muitos economistas aprenderam essa lição de mercado, embora, muitos não entendam a verdadeira lógica por trás da teoria.

Então, qual é o fator crucial dessa história? Para que faça sentido, a curva de demanda agregada deve ser obrigatoriamente descendente. E por que deveria ser verdade?

Bom, em tempos normais, a curva AD é descendente. Mesmo porque, outros fatores, como alto nível de preços, aumentariam a demanda por dinheiro, algo que elevaria a taxa de juros, o que reduziria os consumo. (Em termos de IS-LM, alto P nos leva a um baixo M/P, o que desloca a LM para a esquerda)

No entanto, em condições de pouca liquidez, a taxa de juros do mercado não é afetada na margem pela oferta ou demanda de dinheiro. E como resultado, chegamos à conclusão de que a prerrogativa de uma curva AD descendente perde a validade. Sei que alguns economistas apelarão para o efeito Pigou. Mas, estarão esquecendo de levar em conta a dívida-deflação de Fisher. Por conseguinte, chegamos à conclusão de que, em condições de pouca liquidez, a curva AD está mais para ascendente do que para descendente.

E na década de 30, os EUA estavam com pouca liquidez, com a taxa de juros "3-month T-bills" em apenas 0,14%.

Levando a questão ao extremo, apenas para facilitar, terminaremos o modelo com uma curva AD vertical. Então, a figura ficaria assim:



Por conta disso, não existe efeito adverso para a produção com a elevação do salário.

Então, chegamos à conclusão de que o problema de liquidez teve implicações cruciais para o efeito de políticas como o NIRA. Os críticos ao New Deal assumiram, implicitamente, que a curva AD teve uma inclinação "normal", mesmo nos períodos mais graves de recessão. E isso não aconteceu!

Essa é a argumentação dos que defendem o programa de ajuda às montadoras.

No entanto, esse pensamento é falho. Não estão levando em conta que a demanda agregada depende de uma váriavel amorfa: confiança. Qualquer fator que ameace a oferta agregada no longo prazo, muito provavelmente, reduzirá a confiança da demanda agregada no curto prazo. Assim, a política deslocaria a curva AD, bem como a curva AS, em direções contrárias.

Por essa razão, o governo americano não deveria criar pacotes de ajuda às montadoras. Não faz sentido financiar perdas de um setor como esse. Mais uma vez, uma montanha de dinheiro do contribuinte americano será desperdiçada!

Aos amigos,
o último disco do Zeca Baleiro,

Marcos André Ceciliano