sexta-feira, outubro 15, 2004


Esta seria a placa de agradecimento do candidato André Ceciliano, caso a eleição de Paracambi não tivesse sido fraudada Posted by Hello



A ousadia de se comprar uma eleição

Um cargo político no executivo quando não exercido por alguém que anseia o bem coletivo pode significar favorecimento em licitações, superfaturamento de obras para lavagem de dinheiro e detrimento da saúde coletiva em benefício da máfia dos hospitais particulares. A questão principal para aqueles que estão desejosos por se beneficiar de tais fatos é única: Como fazê-lo?

Provou-se na última eleição que não é muito difícil, em primeira instância escolhe-se um município da baixada, um pequeno, a referência pode ser o fim da linha do trem. Em seguida, procura-se um candidato sem expressão, que aceite passivamente a condição de marionete dos patrocinadores, melhor um que não seja do local, para que o mesmo não apresente rejeição.

Afinal, ninguém quer correr risco em seu investimento. Filia-se o candidato a um partido fraco dentro do município, em que não exista hierárquia e ninguém a quem se reportar. Procura-se dentro dos populares locais um que atenda as características necessárias para a vice-prefeitura, o mesmo não pode ser alguém de pulso, expressão, carisma, tem que ser alguém que por sua obsessão por poder torne-se patético, inferior e medroso acima de tudo.

A segunda etapa é o mapa local, procura-se descobrir quem são os adversários no jogo eleitoral, aqueles que impõe risco ao projeto. Uma vez definidos, inicia-se a estratégia para deprecia-los, se o mais forte estiver exercendo o cargo, melhor. A estratégia principal é mexer com o imaginário popular, promete-se coisas impossíveis: casa para todos, fim de monopólios naturais, CLT em cooperativas, até mesmo uma nova revolução industrial. Na arte da depreciação, concebe-se a fábrica da mentira, começa-se por fazê-la atingir o subconsciente do eleitor, pode ser através do jingle de campanha. Se for contra o atual adminstrador, podem dizer que alguma área do serviço público está doente e que precisa melhorar. Nada muito agressivo, afinal, o apoio do religioso, principalmente do evangélico, é indispensável.

O milagre da multiplicação dos votos é um dispositivo aclamado dentro da política, e só uma pessoa com influência sobre outros pode fazê-lo. Na atual sociedade, estes seriam os pastores de igrejas. Por essa razão, procurar-se-á angariar o apoio de alguns desses santos homens, ou através de promessas absurdas, como o fim do carnaval, festa vista por eles como demoniaca, ou por favorecimento financeiro ou de cargos. O acordo estabelecido entre a campanha e os mesmos deve ser único e os pastores para serem contemplados com os prêmios devem dedicar-se a árdua tarefa de influenciar seus fiéis, que se bata com o microfone na cabeça de algum se for preciso.

Nosso terceiro passo é a propaganda massiva, é necessário impor poder e respeito, compra-se uma frota de carros-de-som, satura-se o espaço urbano com outdoors, ocupa-se cada esquina com pessoas contratadas entregando panfletos e abre-se um comitê em cada bairro. Só há uma preocupação nesse momento, a escolha das pessoas para trabalhar nesses lugares. Procuram-se as pessoas menos instruídas, com pouca capacidade para entender o que se passa ou, que pelo menos, finjam não entendê-lo. Pessoas que não venham a questionar as enormes quantias de dinheiro gastas na estrutura, que se vendam fácil, pessoas que o dinheiro consiga comprar.

Embora tudo o que foi descrito até agora possa ser suficiente para iludir muitos eleitores e disparar em uma eleição, pode ocorrer de naquele município existir um governo de verdade, que tenha feito obras importantes e que possua grande apoio popular, nesse caso, deve-se intensificar a propaganda e os ataques. Atribua através de suas mentiras as características mais absurdas a seus adversários, como por exemplo: arrogância. Diga que seu adversário pronunciou em um discurso que nem Deus o faria perder a eleição. Ou então, faça como o ex-governador, povoe o imaginário do fiel, diga que o candidato benzeu as camisas da campanha na macumba.

Entretanto, se a campanha estiver chegando ao fim e as investidas contra os adversários não estiverem surtindo efeito, prepare-se para o tiro de misericórdia, afinal, os patrocinadores já gastaram muito. Um milhão e duzentos mil a mais pode significar a salvação do que foi investido até agora.

Ainda há a última chance, o dia 3 de outubro, nele está a única forma de derrotar uma campanha de princípios. Prepare-se para comprar a dignidade do mais carente, aproveitar-se da degradação alheia, ver as pessoas abandonarem seus ideais e suas crenças por dinheiro. Mapeie todo o município, designe responsáveis por bairros, os mesmos encontrarão responsáveis por ruas, que por fim, controlarão os grupos de boca-de-urna e compra de votos no dia da eleição.

Estes devem contagiar a população, a premissa básica é a promessa de que, se o voto constar na urna, o eleitor que apresentar o ticket eleitoral receberá de R$ 70,00 a R$ 100,00. Para validar todo o processo faça com que no dia da eleição muitas pessoas vistam a camisa do seu candidato, ofereça até R$ 100,00 para que, uma pessoa vestindo a camisa do adversário mais forte, a retire e vista a da sua campanha. Procure uma forma para que a justiça de seu município não interfira em seus planos e que no fim ainda presentei sua possível vitória com um cocktail, para que não possa restar dúvidas de que a eleição foi legítima.

Se tudo correr bem, você conseguirá a vitória no pleito por uma diferença que pode ser de até 528 votos. Comemore, organize uma carreata, não desanime se da mesma participarem apenas 134 carros, afinal, você comprou uma eleição, não pode esperar que haja apoio popular. Ignore o fato de a cidade parecer estar em luto, pense apenas nas contas do SUS que poderá superfaturar, nas obras que constarão apenas nos papeis de licitação e em como desviar de forma não descarada os recursos de ICMS e IPTU.

Só não cometa um erro, quando estiver pagando a boca-de-urna e ou os votos comprados, não permita que ninguém grave imagens. Não deixe que a polícia prenda nenhum de seus funcionários realizando pagamentos, nem permita que a mesma apreenda tickets eleitorais e a agenda do esquema e nem permita que a população se arrependa, pois a mesma pode querer prestar depoimentos na delegacia ou no ministério público. O caso pode párar na justiça, e se a mesma for imparcial você pagará por seus crimes e perderá o mandato. Caso contrário, comemore, pois este país provará mais uma vez que o dinheiro compra tudo, inclusive a dignidade.

Marcos André Ceciliano