Antes de adentrar no tema do artigo, é preciso lembrar que o povo brasileiro elegeu um Congresso Nacional com maioria conservadora e perfil restritivo de direitos em 2014. Políticos que já demonstraram, numa série de ocasiões, não ter quaisquer pudores para votar medidas impositivas e impopulares.
Os primeiros efeitos desse acidente eleitoral já são percebidos na aplicação das últimas leis sancionadas, produto das votações do primeiro biênio dessa legislatura, principalmente no que se refere a reforma política. Um dos projetos mais polêmicos foi o que criou a regra do mínimo de 10 deputados federais, no partido ou na coligação, como pré-requisito para que candidatos em eleições majoritárias participem dos debates em rádio e TV.
O argumento utilizado à época foi de que, sem a regra, as emissoras seriam obrigadas a convidar a totalidade dos candidatos. Sendo que, em algumas cidades, esse poderia ser um número de dois dígitos. Dessa forma, argumenta-se assertivamente que, com muitos candidatos, os debates perderiam a objetividade e o formato não seria atraente a emissora, candidatos, ou público.
Em que pese o caráter restritivo da lei, há de se concordar que um debate com 10 candidatos não traria qualquer proveito ao processo eleitoral, uma vez que não haveria a chance de se conhecer profundamente as propostas e o perfil dos postulantes aos cargos majoritários.
No entanto, o projeto de lei não homenageou uma situação prática, evidenciada nessa eleição em duas importantes capitais: Rio de Janeiro e São Paulo. Nestas cidades, candidatos do PSOL, partido que não atinge, nem formou coligação que ultrapassa o mínimo de 10 candidatos, figuram entre os 03 primeiros em intenções de voto em pesquisas oficiais registradas.
Ainda que sem redação objetiva, existe uma solução na própria lei para essa situação esdrúxula: um dispositivo permite que as emissoras, concessões públicas, convidem candidatos que estejam fora da regra de bancada partidária mínima.
No entanto, é justamente esse dispositivo que suscita o pedido de inconstitucionalidade, uma vez que, seguindo o redigido pelo câmara, este convite só poderá ser formalizado com a concordância de 2/3 dos candidatos com presença garantida. Ou seja, aqueles cujas bancadas cumpram o mínimo previsto em lei.
Daí, vem a grande questão das Ações Diretas de Inconstitucionalidade julgadas pelo STF nessa quinta-feira, 25/08/2016: em nenhuma das duas capitais, os candidatos aprovaram a participação de Marcelo Freixo e Erundina.
O resultado não deixa de ser óbvio, uma vez que faz referência a um custo de oportunidade evidente aos demais candidatos. Sendo certo que, em se disputando diretamente um cargo, qualquer outra parte que possa ser excluída do debate, que é um tipo de tempo adicional de propaganda, traz benefício àqueles com participação garantida.
Em resumo, criou-se uma regra em lei que nunca será acionada, por uma questão óbvia de não trazer qualquer benefício, e apenas ampliar o risco de se acirrar a disputa, para quem já tem o direito de participação nos debates.
Outro problema claro do dispositivo redigido pelo legislador é a dação de poder de veto a um simples candidato que, não necessariamente teria um mandato político em curso; e ainda que o tivesse, poderia não ser representativo da maioria, o que abre forte discussão sobre a legitimidade do Poder que lhe é atribuído quanto ao veto de outro postulante ao cargo que disputa.
Felizmente, todas essas questões ficaram claras aos Ministros do STF, que passaram a discutir uma solução para o caso. A maior dificuldade, que tomou algumas horas do pleno, era de como resolver a exuberância sem criar regra, ou seja, sem dar nova redação a lei.
Para o Ministro Toffoli, a saída passava por determinar que, se o candidato estivesse bem posicionado nas pesquisas, na mesma medida daqueles que tinham o direito de participação nos debates, ele deveria ser convidado. No entanto, o Ministro Teori entendeu corretamente que essa solução extrapolava a atribuição da corte, pois o STF estaria agindo como legislador positivo, o que não se poderia assentar de forma alguma.
A saída veio da Ministra Rosa Weber, que sugeriu vetar o trecho que trata dos 2/3, o que daria poderes apenas a emissora.
Essa solução passa por acreditar que a emissora, embora ente privado e eventualmente partidária, teria o compromisso democrático de convidar os candidatos mais bem posicionados nas pesquisas. Em se tratando de Brasil, sabemos que essa solução poderá não ser cumprida. Porém, só de termos eliminado o poder esdrúxulo do veto, já podemos dizer que houve grande avanço.
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