terça-feira, março 08, 2016

A Condução Coercitiva da Democracia

Na última sexta-feira, 04/03/2016, todo o Brasil assistiu pela grande imprensa a execução de medida coercitiva contra o Presidente Lula, na 24ª fase da LavaJato.

De acordo com a lei, a medida coercitiva, que nada mais significa do que obrigar alguém a fazer algo por meios relativamente violentos, deve ser utilizada pelo Estado, na justa medida das necessidades de efetivação da ordem pública.

Isso posto, o que justificou a condução coercitiva de Lula, este cidadão que nunca se negou a prestar depoimento sobre qualquer assunto? E que, nos últimos meses, já prestou 04 depoimentos em diferentes inquéritos, sem qualquer resistência. Esses são fatos, destaque-se, que demonstram a desproporcionalidade da medida coercitiva, deflagrando ação errática dos investigadores.

Outra incógnita, pessimamente justificada, foi a escolha do local para a tomada do depoimento: uma sala no aeroporto de Congonhas, em vez da sede da PF em São Paulo. Decisão que levou muitos internautas a especularem que o objetivo da tomada de depoimento era comprometer Lula, e levá-lo preso a Curitiba.

Especulações a parte, o que deve ser considerado e valorado são as manifestações de juristas que condenaram as ações, conforme reproduzo abaixo:

"Não conheço na nossa legislação a figura da condução coercitiva sem que tenha havida antes a convocação. (...) Logo, a condução coercitiva foi um exagero. E na realidade o que parece é que esse Juiz queria era prender o Lula. Não teve a ousadia de fazê-lo e saiu pela tangente."
José Gregori, Ministro da Justiça de FHC (2000-2001), em entrevista a BBC.

"Acho que buscas e apreensões são atividades normais em investigação. Agora, o que eu estranho, como jurista, é a condução coercitiva do Lula. É algo surpreendente e preocupante."
Walter Maierovitch, Secretário Nacional Anti-drogas de FHC, em entrevista a BBC.

"Condução coercitiva? O que é isso? Eu não compreendi. Só se conduz coercitivamente, ou, como se dizia antigamente, debaixo de vara, o cidadão que resiste e não comparece para depor. E o Lula não foi intimado. Não se avança atropelando regras básicas."
Marco Aurélio de Mello, Ministro do StF, em entrevista a Folha.

"Há uma regra lógica, que a coercitividade se faça necessária."
Carlos Ayres Britto, Ex-Ministro do StF, em entrevista a Folha.

"A condução coercitiva de um ex-presidente passou dos limites, parece coisa medieval."
Nelio Machado, renomado advogado criminalista.

"Nesse quadro lógico me parece equivocada qualquer condução coercitiva. Parece uma simples justificativa para a violência estatal, o que é inadmissível."
Renato de Mello Silveira, Professor de Direito Penal da USP.

Após tantas manifestações, só nos resta concluir que a decisão do Juiz Moro foi equivocada e serviu a espetacularização midiática do depoimento de Lula. Essa é uma linha de pensamento que, por todo o exposto, é de difícil contestação.

No domingo, o programa Fantástico vazou outro documento da Polícia Federal (mais um), com o resumo cronológico da operação. Muitos trechos são de difícil aceitação, como aquele no qual é justificada a medida coercitiva para a proteção do depoente. Ora, se a segurança do depoente era foco de preocupação, por que escolher um aeroporto para a tomada do depoimento? Essa justificativa não pareceu nada razoável aos olhos do Ministro Marco Aurélio, conforme afirmado em entrevista a Band, também no domingo.

No entanto, independente da forma como Lula foi conduzido, só existe uma razão para tornar-se depoente: esclarecer fatos no processo de investigação da LavaJato.

É sob esse aspecto que conseguimos identificar os verdadeiros problemas e violações democráticas da investigação, que levam a medida coercitiva a ser considerada um erro menor.

A LavaJato, como é de amplo conhecimento, corre em segredo de justiça, ao que nenhuma das suas informações deveriam estampar jornais. E essa, há de se convir, é uma violação grave ao direito dos investigados.

Ou seja, os jornais recebem informações sigilosas da investigação quase que diariamente, e as publicam sem pudores, enquanto os advogados de defesa ficam às cegas no processo. Essa rotina não pode ser séria. E o pior é que não percebemos quaisquer medidas efetivas do Juiz para punir os vazadores de informações à imprensa. Esse é outro problema grave da LavaJato.

O desdobramento dessas ações, na imprensa brasileira, são matérias parciais, nada republicanas, que visam única e exclusivamente macular um único partido político e o governo eleito da Presidenta Dilma Rousseff. E todos sabemos o quanto o país já perdeu com esse jogo político.

Vejam vocês que existem 32 parlamentares do PP, e apenas 5 do PT, indiciados por desvios na Petrobras. Números que nos levariam a crer que o esquema de corrupção da LavaJato era dominado pelo Partido Progressista. No entanto, a imprensa conseguiu carimbar na consciência do Brasileiro, mais uma vez, que o PT é o grande culpado e arquiteto da corrupção na Estatal, o que não se comprova.

Nunca é demais lembrar que os verdadeiros crimes da LavaJato são os de Cartel. Ou seja, empresas que combinavam preços em concorrências, para que não houvesse a disputa, fazendo com que os contratos as remunerassem no valor máximo do orçamento.

Bem, e o que o Presidente Lula tem a ver com isso? Nada. Pelo que já foi noticiado, a questão da LavaJato com Lula é outra, e trilha o caminho da especulação.

Como é de conhecimento geral, após deixar a Presidência, Lula abriu uma empresa de palestras. Prática comum entre ex-presidentes, como FHC, Bill Clinton e Sarkozy. Essas palestras, que tinham preço médio de U$ 150 mil, foram vendidas mundialmente e geraram boas receitas a empresa do Presidente.

E por que Lula faz palestras? Antes de tudo, porque é um dos presidentes mais bem avaliados do mundo. E porque seu governo foi vitorioso em muitos aspectos da economia: por ter tirado 40 milhões de brasileiros da miséria; pelo desenvolvimento da industria naval, retomada da construção civil; por programas bem sucedidos de infraestrutura, segurança alimentar, habitação,...

No entanto, segundo a LavaJato, Lula foi beneficiado por construtoras, através de pagamentos disfarçados de palestras, e estaria realizando ocultação de patrimônio: um apartamento no Guarujá e um sítio em Atibaia.

É um atentado à inteligência coletiva especular que Lula é o principal beneficiário da corrupção da Petrobras. Um homem que mora num apartamento de janela de alumínio no ABC paulista, bairro simples, cuja fachada é revestida em cerâmica.

É patético levantar suspeita de ocultação de patrimônio ao falar de um sítio em Atibaia, emprestado por um amigo, que Lula visita frequentemente. Quem é multi-milionário, como especulam, vai fazer o que em Atibaia? Pelo amor de Deus, esse tipo de ilação tange ao ridículo. Qualquer um percebe o exagero, menos os investigadores da Lavajato, que o toma como base para uma investigação e também para a aplicação de medida coercitiva.

A verdade é que toda essa exposição midiática, ancorada num processo de investigação deturpada, tem apenas uma justificativa: o medo. Os setores de oposição tem medo da força do Lula. Estão apavorados porque sabem que ele vencerá a eleição de 2018.

Só me pergunto o porquê de ninguém investigar até hoje o apartamento de FHC na Av. Foch (rua mais cara de Paris), avaliado em € 11 milhões (R$ 55 milhões). E agora, recentemente noticiado por Miriam Dutra, o apartamento da Trump Tower, em NY.

Acho que Moro está passando longe da verdadeira corrupção do país.

Aos amigos,
Chico Buarque, Artista Brasileiro.

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