domingo, março 20, 2016

Duas Manifestações e um Sentimento de Urgência Imposta

Num intervalo inferior a uma semana, o Brasil assistiu a duas grandes manifestações populares: no domingo, 13/03/2016, manifestaram-se os opositores ao governo eleito da Presidenta Dilma Roussef, que pedem o seu impeachment, intervenção militar e o fim dos programas sociais.

Na sexta-feira, 18/03/2016, tomaram as ruas os defensores do governo, pedindo a manutenção das garantias legais, do estado democrático de direito e o fim, segundo os próprios, das aberrações jurídicas na investigação LavaJato.

Para a compreensão do atual cenário político do país, que transita entre vazamentos de investigação sigilosa e cobertura midiática tendenciosa, faz-se indispensável analisar friamente as características das duas manifestações.

São quatro as perguntas que considero importantes nesse processo de entendimento, conforme abaixo:

1 - QUANTOS MANIFESTANTES OCUPARAM AS RUAS?

Em se considerando todo o aparato estatístico do mundo moderno, essa deveria ser uma pergunta de fácil resposta. No entanto, dado o interesse político nesses números, existem 3 repostas possíveis para essa pergunta: a contagem dos Organizadores, a da Polícia Militar e a do Instituto Datafolha.

Os organizadores obviamente apresentam números extremamente superlativos, sem qualquer conexão com a realidade. O que é normal, em se tratando do interesse direto no sucesso da manifestação. Já a empresa Instituto Datafolha, embora tenha obrigação de ser imparcial, entrou em estado de suspeição, por conta dos resultados das pesquisas eleitorais de 2014.

No que se refere a Polícia Militar, que deveria ser o fiel da balança, acaba por ser a menos confiável dessas três. Isso porque, as polícias militares no Brasil estão sob o comando dos governadores de Estado, que tem mandato, partido e interesses políticos.

No caso de São Paulo, o Estado com maior número de manifestantes, o Governador é do maior partido de oposição ao governo, o PSDB.

Ainda assim, apesar das ressalvas, existem limites físicos e estatísticos para essas estimativas.

Nesse aspecto, vale o esclarecido pelo DataFolha: no caso da Av. Paulista, local em que ocorrem os protestos em São Paulo, não existe a possibilidade física de se colocar mais do que 500 mil pessoas. Essa é uma limitação matemática, que considera o espaço útil da avenida, por m2.

No entanto, de acordo com os opositores ao governo, foram 2,5 milhões de manifestantes no domingo; a Polícia militar estimou 1,4 milhão; e o DataFolha 500 mil manifestantes.

Bom, de início, descarta-se a quantidade dos organizadores e passa-se a analisar o número da polícia militar: 1,4 milhão de pessoas. Segundo o DataFolha, esse número seria impossível de se obter, pois significaria a assunção de que existiam 7 manifestantes por m2, em toda a área ocupavél da Av. Paulista, o que é fisicamente impossível.

Então, o número do DataFolha, limite físico máximo do local, pode ser considerado o correto. Ou seja, foram 500 mil pessoas na manifestação de domingo, a favor do impeachment da Presidenta Dilma Roussef.

No caso da manifestação favorável ao governo, na sexta-feira, o número dos organizadores era de 380 mil pessoas; da Polícia Militar, de 80 mil pessoas; e do Datafolha, 95 mil pessoas.

Para demonstrar que existem erros grosseiros nas estimativas da Polícia Militar e do Datafolha, utilizaremos uma foto aérea das duas manifestações em São Paulo:



Enquanto na manifestação de domingo (foto a direita), fechamos posição no limite máximo de 500 mil pessoas, não é razoável dizer que na manifestação de sexta-feira (foto a esquerda) estiveram presentes apenas 80 mil pessoas. Essa foi a estimativa da Polícia Militar de SP, do Governador Geraldo Alckmin, opositor ao governo.

Como pode a Polícia Militar, ao analisar a imagem acima, dizer que eram 1,3 milhão a direita e 95 mil a esquerda? Sendo que o limite máximo do local são 500 mil pessoas; e que, conforme esclarecido pelo Datafolha, para se ter 1,3 milhão de pessoas no domingo, também seria preciso que a Av. da Consolação estivesse totalmente tomada.

Percebe-se um erro grosseiro nesse tipo de estimativa, que não foi sequer criticado pela imprensa. Os números eram dados pelas emissoras com toda pompa, e um dos líderes da oposição chegou a dizer que as manifestações de sexta foram 13 vezes menores que as de domingo. Como seria possível?

A partir da análise fotográfica, acabamos por concordar com os organizadores do movimento de sexta-feira. Se haviam 500 mil no domingo, eram pelo menos 380 mil na sexta-feira. O que demonstra que as manifestações contrárias ao governo estão em mesma quantidade daquelas favoráveis, o que nos remete a uma situação de equidade entre os movimentos.

2 - QUEM CONVOCOU OS MANIFESTANTES?

Essa é outra pergunta importante, indispensável ao entendimento da situação política no Brasil.

A manifestação de domingo foi convocada por políticos da oposição; movimentos de direita, favoráveis a intervenção militar; a Federeção das Industrias de São Paulo (FIESP); artistas e jornalistas da grande imprensa.

Já a manifestação de sexta-feira, favorável ao governo da Presidenta Dilma Roussef, foi convocada por partidos políticos da base do governo; sindicatos de professores; movimentos sociais; a Central Única dos Trabalhadores; Escolas de Direito das maiores universidades do país; a União dos Estudantes (UNE); artistas e jornalistas independentes, que atuam em blogs.

A imprensa teve um papel muito importante na manifestação de domingo, porque as chamadas eram constantes e ao vivo. Os repórteres entrevistaram diversos integrantes da manifestação, que discursavam e conclamavam quem estava em casa a se unir aos manifestantes. Efeito de propagação eficaz, que os manifestantes favoráveis ao governo não tiveram na sexta.

No entanto, há uma distinção muito grave entre os dois movimentos: os políticos que convocaram a manifestação de domingo, o Senador Aécio Neves e o Governador Geraldo Alckmin, foram hostilizados pela multidão e tiveram de sair corridos do local. Enquanto, o principal articulador do movimento de sexta-feira, o ex-presidente Lula, foi conclamado pelos manifestantes, fez discursos e foi imensamente aplaudido pelos presentes na Av. Paulista.

Essa é uma situação extremamente crítica para a oposição, e não deve ser considerada uma vantagem para o governo. Quando uma manifestação de grande número quer um resultado político imediato, que é a deposição da Presidenta da República, rejeitando justamente os políticos da oposição, que estão a espreita para assumir o governo. o que se tem é um movimento imprevisível, que coloca em risco todo o sistema republicano e suas instituições.

A turma de domingo deixou clara a sua mensagem: quer fazer política sem políticos, e também pede intervenção militar. Algo que nos remete a uma página drástica da história do Brasil, o golpe militar de 1964.

3 - QUEM ERAM OS MANIFESTANTES?

Traçar o perfil dos manifestantes também é tarefa estatística. A manifestação de sexta-feira nos ajuda nesse quesito, uma vez que foi realizada em dia de semana, próximo ao fim do expediente de trabalho. O que nos leva a constatar que a maioria dos presentes eram trabalhadores.

No caso da manifestação de domingo, que teve metrô gratuito e filé mignon distribuído pela FIESP, faz-se necessária uma análise profissional, para melhor entender o perfil do manifestante.


Por essa razão, analisaremos os dados levantados pelo DataFolha, colhidos durante a manifestação de domingo, que foram publicados pela Folha de São Paulo.

De início, percebe-se que os manifestantes da Paulista no domingo não são amostra representativa da população brasileira, uma vez que 37% destes ganham acima de 10 salários mínimos; e que 77% tem curso superior. Enquanto apenas 6% dos manifestantes ganham até 2 salários mínimos, e apenas 4% estudaram até o ensino fundamental, renda e escolaridade da maior parcela da população brasileira.



O que isso nos mostra? Que os manifestantes da Av. Paulista, apesar de terem reunido 500 mil pessoas, não são amostra representativa da população brasileira. Ou seja, essa parcela da população não tem legitimidade para falar em nome do Brasil, pois não é composta proporcionalmente pela maioria da população.

Esse é um ponto importantíssimo, que não foi discutido pela grande imprensa, e que prejudica enormemente o entendimento das manifestações. Pois o movimento de domingo é claramente uma manifestação da elite brasileira, que teve seu candidato derrotado nas últimas eleições.

Infelizmente, não poderei contar com os dados do Datafolha para analisar a manifestação da sexta-feira, uma vez que o instituto não divulgou qualquer levantamento. Então, farei a comparação a partir da minha experiência pessoal, de quem compareceu aos atos no Rio de Janeiro.

Registro que a experiência na Praça XV foi extremamente tocante, do início ao fim. Eram estudantes, trabalhadores, artistas, movimentos sociais, políticos, jornalistas, aposentados, advogados e servidores públicos. Na visão de quem transitou pelo espaço o tempo inteiro, posso dizer que havia naquele local a diversidade de pobres e ricos, brancos e negros, analfabetos e doutores. Enfim, um quadro representativo do povo brasileiro.

Havia muita harmonia, solidariedade e cumplicidade entre os presentes. As pessoas se entreolhavam, sorriam, e muitos choraram. Haviam muitos outros olhos lacrimejantes.

4 - O QUE QUEREM OS MANIFESTANTES?

A pauta dos manifestantes de domingo recebeu ampla divulgação pela imprensa, e pode ser resumida nas seguintes demandas: o impeachment da Presidenta Dilma Roussef; intervenção militar; o fim dos programas sociais; o fim da corrupção; a prisão do ex-presidente Lula; e a queda do dólar (sic).

Há no Brasil uma clara confusão de causa e efeito na cabeça da população, que atribui ao governo os efeitos da retração econômica mundial, ignorando por completo a dependência da economia brasileira ao preço do petróleo, do minério de ferro, da atividade produtiva da China e das Commodities.

Contribui em demasia para essa confusão a atuação da imprensa, que não esclarece o contexto da crise mundial na qual o Brasil está inserido, preferindo repetir diariamente que a culpa é exclusivamente das políticas do governo da Presidenta Dilma Roussef.

Para uma população que, há pouco mais de uma década, ascendeu a classe média, esse é o maior combustível para a indignação e o desejo pela mudança de governo. Ainda mais, quando a grande imprensa repete diariamente que um novo governo poderia resolver a situação econômica do país.

O que não é verdade, uma vez que nossa melhora depende exclusivamente dos agentes econômicos externos. Enquanto, o que se pode mudar através da política de governo hoje é muito pouco, e se resume a um ajuste fiscal, que não resolverá a crise, mas tentará suavizá-la.

Também é verdade que o Presidente da Câmara dos Deputados, investigado por corrupção em diversos processos, nada fez para colocar em votação o ajuste econômico proposto pela Presidência. E, por incrível que pareça, ele não foi alvo das manifestações de domingo, que também se intitulam contra a corrupção.

Então, conclui-se que há uma grande confusão da parte dos manifestantes de domingo: que são contra a corrupção, mas não pedem a prisão do Presidente da Câmara; que querem a melhora da economia, mas não cobram do Congresso a votação do ajuste econômico; e que evocam direitos e democracia, mas pedem intervenção militar.

A pauta da manifestação de sexta-feira vem como que na contramão: pede o fim do que consideram excessos do Juiz Sérgio Moro; a rejeição do processo de impeachment da Presidenta Dilma Roussef no Congresso; a confirmação da nomeação do ex-presidente Lula à Casa Civil; o fim da exploração distorcida da situação do país pela mídia; o fim dos vazamentos de provas em processos sigilosos; e a manutenção das garantias individuais e do Estado Democrático de Direito.

Os reclames dos manifestantes de sexta surgiram da preocupação em relação ao andamento da operação LavaJato, que vaza constantemente a imprensa as delações contra o governo. Ato irresponsável, agravado pelo fato de que delação não é prova, e que só serve para incendiar a opinião pública.

A sucessão de vazamentos gerou um sentimento de desagravo as ações do Juiz Sérgio Moro, que atingiu seu ápice quando foram tornadas públicas as conversas do ex-presidente Lula, inclusive com a Presidenta da República. O Ministro Marco Aurélio somou sua voz a de diversos magistrados, que afirmaram que essas ações estão a margem da lei, ainda mais quando o processo deveria seguir em segredo de justiça para o STF.

Sem falar no frisson que causou a autorização de grampo no escritório de advocacia que defende os investigados, ferindo o direito ao sigilo na relação cliente-advogado. Medida inadmissível a uma democracia consolidada, e própria de regimes de exceção.

Todas essas ações demonstram uma clara ameaça ao Estado Democrático de Direito no Brasil, o que causa perplexidade a parcela esclarecida da população.

Em resumo, esses foram os motivos que levaram os manifestantes de sexta a pedirem a reforma da decisão que impediu a posse do Ex-Presidente Lula na chefia da Casa Civil, enquanto este não é sequer réu na justiça.

Independente das manifestações, a sensação que temos hoje no Brasil é de uma enorme insegurança jurídica. É um sentimento de urgência imposta, num momento de total desarmonia entre os integrantes dos três poderes, agravado pela perseguição midiática a um único partido político.

Ainda bem que tivemos a sexta-feira.

terça-feira, março 08, 2016

A Condução Coercitiva da Democracia

Na última sexta-feira, 04/03/2016, todo o Brasil assistiu pela grande imprensa a execução de medida coercitiva contra o Presidente Lula, na 24ª fase da LavaJato.

De acordo com a lei, a medida coercitiva, que nada mais significa do que obrigar alguém a fazer algo por meios relativamente violentos, deve ser utilizada pelo Estado, na justa medida das necessidades de efetivação da ordem pública.

Isso posto, o que justificou a condução coercitiva de Lula, este cidadão que nunca se negou a prestar depoimento sobre qualquer assunto? E que, nos últimos meses, já prestou 04 depoimentos em diferentes inquéritos, sem qualquer resistência. Esses são fatos, destaque-se, que demonstram a desproporcionalidade da medida coercitiva, deflagrando ação errática dos investigadores.

Outra incógnita, pessimamente justificada, foi a escolha do local para a tomada do depoimento: uma sala no aeroporto de Congonhas, em vez da sede da PF em São Paulo. Decisão que levou muitos internautas a especularem que o objetivo da tomada de depoimento era comprometer Lula, e levá-lo preso a Curitiba.

Especulações a parte, o que deve ser considerado e valorado são as manifestações de juristas que condenaram as ações, conforme reproduzo abaixo:

"Não conheço na nossa legislação a figura da condução coercitiva sem que tenha havida antes a convocação. (...) Logo, a condução coercitiva foi um exagero. E na realidade o que parece é que esse Juiz queria era prender o Lula. Não teve a ousadia de fazê-lo e saiu pela tangente."
José Gregori, Ministro da Justiça de FHC (2000-2001), em entrevista a BBC.

"Acho que buscas e apreensões são atividades normais em investigação. Agora, o que eu estranho, como jurista, é a condução coercitiva do Lula. É algo surpreendente e preocupante."
Walter Maierovitch, Secretário Nacional Anti-drogas de FHC, em entrevista a BBC.

"Condução coercitiva? O que é isso? Eu não compreendi. Só se conduz coercitivamente, ou, como se dizia antigamente, debaixo de vara, o cidadão que resiste e não comparece para depor. E o Lula não foi intimado. Não se avança atropelando regras básicas."
Marco Aurélio de Mello, Ministro do StF, em entrevista a Folha.

"Há uma regra lógica, que a coercitividade se faça necessária."
Carlos Ayres Britto, Ex-Ministro do StF, em entrevista a Folha.

"A condução coercitiva de um ex-presidente passou dos limites, parece coisa medieval."
Nelio Machado, renomado advogado criminalista.

"Nesse quadro lógico me parece equivocada qualquer condução coercitiva. Parece uma simples justificativa para a violência estatal, o que é inadmissível."
Renato de Mello Silveira, Professor de Direito Penal da USP.

Após tantas manifestações, só nos resta concluir que a decisão do Juiz Moro foi equivocada e serviu a espetacularização midiática do depoimento de Lula. Essa é uma linha de pensamento que, por todo o exposto, é de difícil contestação.

No domingo, o programa Fantástico vazou outro documento da Polícia Federal (mais um), com o resumo cronológico da operação. Muitos trechos são de difícil aceitação, como aquele no qual é justificada a medida coercitiva para a proteção do depoente. Ora, se a segurança do depoente era foco de preocupação, por que escolher um aeroporto para a tomada do depoimento? Essa justificativa não pareceu nada razoável aos olhos do Ministro Marco Aurélio, conforme afirmado em entrevista a Band, também no domingo.

No entanto, independente da forma como Lula foi conduzido, só existe uma razão para tornar-se depoente: esclarecer fatos no processo de investigação da LavaJato.

É sob esse aspecto que conseguimos identificar os verdadeiros problemas e violações democráticas da investigação, que levam a medida coercitiva a ser considerada um erro menor.

A LavaJato, como é de amplo conhecimento, corre em segredo de justiça, ao que nenhuma das suas informações deveriam estampar jornais. E essa, há de se convir, é uma violação grave ao direito dos investigados.

Ou seja, os jornais recebem informações sigilosas da investigação quase que diariamente, e as publicam sem pudores, enquanto os advogados de defesa ficam às cegas no processo. Essa rotina não pode ser séria. E o pior é que não percebemos quaisquer medidas efetivas do Juiz para punir os vazadores de informações à imprensa. Esse é outro problema grave da LavaJato.

O desdobramento dessas ações, na imprensa brasileira, são matérias parciais, nada republicanas, que visam única e exclusivamente macular um único partido político e o governo eleito da Presidenta Dilma Rousseff. E todos sabemos o quanto o país já perdeu com esse jogo político.

Vejam vocês que existem 32 parlamentares do PP, e apenas 5 do PT, indiciados por desvios na Petrobras. Números que nos levariam a crer que o esquema de corrupção da LavaJato era dominado pelo Partido Progressista. No entanto, a imprensa conseguiu carimbar na consciência do Brasileiro, mais uma vez, que o PT é o grande culpado e arquiteto da corrupção na Estatal, o que não se comprova.

Nunca é demais lembrar que os verdadeiros crimes da LavaJato são os de Cartel. Ou seja, empresas que combinavam preços em concorrências, para que não houvesse a disputa, fazendo com que os contratos as remunerassem no valor máximo do orçamento.

Bem, e o que o Presidente Lula tem a ver com isso? Nada. Pelo que já foi noticiado, a questão da LavaJato com Lula é outra, e trilha o caminho da especulação.

Como é de conhecimento geral, após deixar a Presidência, Lula abriu uma empresa de palestras. Prática comum entre ex-presidentes, como FHC, Bill Clinton e Sarkozy. Essas palestras, que tinham preço médio de U$ 150 mil, foram vendidas mundialmente e geraram boas receitas a empresa do Presidente.

E por que Lula faz palestras? Antes de tudo, porque é um dos presidentes mais bem avaliados do mundo. E porque seu governo foi vitorioso em muitos aspectos da economia: por ter tirado 40 milhões de brasileiros da miséria; pelo desenvolvimento da industria naval, retomada da construção civil; por programas bem sucedidos de infraestrutura, segurança alimentar, habitação,...

No entanto, segundo a LavaJato, Lula foi beneficiado por construtoras, através de pagamentos disfarçados de palestras, e estaria realizando ocultação de patrimônio: um apartamento no Guarujá e um sítio em Atibaia.

É um atentado à inteligência coletiva especular que Lula é o principal beneficiário da corrupção da Petrobras. Um homem que mora num apartamento de janela de alumínio no ABC paulista, bairro simples, cuja fachada é revestida em cerâmica.

É patético levantar suspeita de ocultação de patrimônio ao falar de um sítio em Atibaia, emprestado por um amigo, que Lula visita frequentemente. Quem é multi-milionário, como especulam, vai fazer o que em Atibaia? Pelo amor de Deus, esse tipo de ilação tange ao ridículo. Qualquer um percebe o exagero, menos os investigadores da Lavajato, que o toma como base para uma investigação e também para a aplicação de medida coercitiva.

A verdade é que toda essa exposição midiática, ancorada num processo de investigação deturpada, tem apenas uma justificativa: o medo. Os setores de oposição tem medo da força do Lula. Estão apavorados porque sabem que ele vencerá a eleição de 2018.

Só me pergunto o porquê de ninguém investigar até hoje o apartamento de FHC na Av. Foch (rua mais cara de Paris), avaliado em € 11 milhões (R$ 55 milhões). E agora, recentemente noticiado por Miriam Dutra, o apartamento da Trump Tower, em NY.

Acho que Moro está passando longe da verdadeira corrupção do país.

Aos amigos,
Chico Buarque, Artista Brasileiro.

terça-feira, março 01, 2016

Carta da Conjuntura Econômica/FGV

Antes de adentrar no assunto do post, gostaria de fazer um apelo ao IBRE, para que melhore a distribuição da revista Conjuntura Econômica no Rio de Janeiro. Somente no sábado, 27/02/2016, consegui adquirir um exemplar da edição de fevereiro, numa busca que já durava quase duas semanas.

Como consequência, só consegui ler a edição de fevereiro em 1º de março. Mas, essa é uma espera sempre vale a pena. A Conjuntura é um periódico de alta qualidade, com um grupo de pesquisa incrível na retaguarda. Uma das poucas publicações de economia com real valor no Brasil. Suas matérias viraram o meu alento, depois que cancelei a assinatura do Valor Econômico, em razão da sua escancarada parcialidade política.

O que me inquietou nessa edição, encorajando-me a essa escrita, foi a carta da Conjuntura, publicada na página 06 do periódioco. Há de se reconhecer que o texto do Dr. Guilherme Schymura possui um título de fácil aceitação: "Incentivos a formalização não são panaceia da produtividade", que nos leva a uma concordância quase que automática.

Considero correta a crítica de que não é verdadeira a propalada causalidade entre a formalização e a melhora da produtividade. No entanto, apesar da afirmação ser assertiva, não são as justificativas da carta que a explicam com propriedade. No caso do Brasil, em específico, o problema está na política torpe de acesso ao crédito através de bancos públicos e privados.

São muitas as empresas que saem da informalidade com bons produtos e serviços, buscando a expansão de suas plantas e aumento da produtividade, mas que tornam-se desiludidas com a burocracia e as exigências de garantias para a obtenção de crédito no Brasil.

Caso existisse o real interesse dos bancos no fomento, o corolário entre o aumento da formalização e o aumento da produtividade poderia ser verdadeiro. No entanto, o autor parece ter optado por excluir do rol das causas os entraves do sistema bancário brasileiro.

Na sequência, o texto parte para o combate as políticas de renúncia fiscal no Brasil, provenientes dos modelos simplificados de tributação, que tem como maior pretensão a redução da informalidade. Critica também o fato de que o CAE do Senado Federal aprovou o aumento dos limites de enquadramento no Simples Nacional, através do PLC 125/2015. E termina por considerar que a criação de faixas com menor tributação é distribuir benesses, o que não deveria ocorrer num momento em que as contas públicas passam por vulnerabilidade extrema.

Confesso que essa última passagem me deixou perturbado. Ficou escancarada, em letras garrafais, a mensagem do texto: a redução de impostos não é desejável e prejudicará o equilíbrio das contas públicas. Como é possível, com acesso irrestrito a tantos dados, que uma publicação da FGV não avente numa discussão como essa o fato do Brasil possuir uma das tributações de renda mais brandas da OCDE? Com alíquota máxima de 27,5%, enquanto a média da organização é de 41,58%.

É alarmante concluir que, segundo dados do IPEA, 51% da carga tributária no Brasil advém dos impostos indiretos, aqueles incidentes igualmente no consumo dos mais ricos e mais pobres; e que apenas 22% se referem a tributação da renda. Enquanto que nos países mais ricos, como a maior parte dos integrantes do G20, o percentual do imposto de renda nessa composição pode chegar a 66%.

Esses números explicam com facilidade a manutenção da desigualdade social em nosso país, uma vez que, com impostos indiretos mais altos, o custo de vida dos que possuem menor renda não permite quaisquer sobras para investimentos em meios próprios de produção. Existem muitos ensaios com conjunto probatório bem sucedido nesse caminho, como por exemplo demonstra "O Capital", de Thomas Piketty

No Brasil, como verificado na carta da Conjuntura, essa é uma questão da qual se foge deliberadamente. A verdade é que precisamos tributar mais a renda, criar novas faixas de IR e reduzir os impostos indiretos. Devemos, portanto, apoiar maiores tetos para o Simples Nacional e EPP. Não são benesses, deixemos claro. O que faltar nessa equação, deverá sair do IR dos mais ricos.

Aos amigos,
O merecido Oscar a Spotlight.